15.2.10

A Comissão da Calúnia

Em artigo, o general Maynard Marques Santa Rosa chamou a "Comissão da Verdade", criada por decreto presidencial, de "Comissão da Calúnia".


Foi exonerado nesta quarta (10/2) o general de quatro estrelas Maynard Marques de Santa Rosa, chefe do Departamento Geral do Pessoal do Exército. Ele fez críticas a um dos pontos do Programa Nacional dos Direitos Humanos.

A crítica foi feita pela internet. O alvo, a Comissão da Verdade, criada por um decreto presidencial, no fim do ano passado, e que causou revolta nas Forças Armadas.

O presidente Lula teve de assinar um novo decreto deixando claro que o objetivo da comissão não é de punir os culpados por violações de direitos humanos durante o regime militar, mas apenas de resgatar a história das violações da ditadura.

Em seu artigo, o general Maynard Marques Santa Rosa diz que "a Comissão da Verdade será composta por fanáticos que no passado recente adotaram o terrorismo, o sequestro de inocentes e o assalto a bancos como meio de combate ao regime, para alcançar o poder". O general ainda chama a Comissão da Verdade de "Comissão da Calúnia".

Assim que soube do texto, citado nesta quarta em reportagem do jornal Folha de São Paulo, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, anunciou a demissão de Santa Rosa.

“Eu acabei de enviar ao presidente da República a exoneração do general Santa Rosa da chefia de Departamento Pessoal e a sua colocação à disposição do comando do Exército”.

Em nota, o Exército diz que foi o próprio comandante Enzo Peri quem sugeriu a exoneração de Santa Rosa do cargo, mas o general continuará trabalhando no comando do Exército.

Essa não é primeira vez que Maynard Santa Rosa entra em conflito com o governo. Ele é considerado um general linha dura e já se manifestou contra o fortalecimento do Ministério da Defesa sob o comando de um civil.

Santa Rosa também perdeu uma secretaria no ministério depois de criticar a estratégia do governo em relação à reserva Raposa Serra do Sol.

Mas, no Senado, a saída do general foi criticada pela oposição. “Eu acho que nesse caso o que era preciso era a aplicação do remédio do diálogo e não da demissão, que impõe um comportamento e que tenta sufocar divergências que a gente sabe que existe em toda parte e também nas Forças Armadas”, opinou o senador e líder de partido José Agripino (DEM-RN).

Carta

Na nota divulgada na internet, o general diria que a comissão da verdade, uma das medidas previstas no plano de direitos humanos, que seria criada pelo governo para investigar crimes contra os direitos humanos durante a ditadura militar (1964-1985), seria formada por "fanáticos" e viraria uma "comissão da calúnia".

O militar afirmaria que os integrantes da comissão seriam os "mesmos fanáticos que, no passado recente, adotaram o terrorismo, o sequestro de inocentes e o assalto a bancos como meio de combate ao regime, para alcançar o poder".

A nota também diz que "confiar a fanáticos a busca da verdade é o mesmo que entregar o galinheiro aos cuidados da raposa”. Para o militar, “a história da inquisição espanhola espelha o perigo do poder concedido a fanáticos. Quando os sicários de Tomás de Torquemada [1420-1498] viram-se livres para investigar a vida alheia, a sanha persecutória conseguiu flagelar 30 mil vítimas por ano".

Leia a íntegra da suposta carta:

"A COMISSÃO DA “VERDADE”?

A verdade é o apanágio do pensamento, o ideal da filosofia, a base fundamental da ciência. Absoluta, transcende opiniões e consensos, e não admite incertezas.

A busca do conhecimento verdadeiro é o objetivo do método científico. No memorável “Discurso sobre o Método”, René Descartes, pai do racionalismo francês, alertou sobre as ameaças à isenção dos julgamentos, ao afirmar que “a precipitação e a prevenção são os maiores inimigos da verdade”.

A opinião ideológica é antes de tudo dogmática, por vício de origem. Por isso, as mentes ideológicas tendem naturalmente ao fanatismo. Estudando o assunto, o filósofo Friedrich Nietszche concluiu que “as opiniões são mais perigosas para a verdade do que as mentiras”.

Confiar a fanáticos a busca da verdade é o mesmo que entregar o galinheiro aos cuidados da raposa.

A História da inquisição espanhola espelha o perigo do poder concedido a fanáticos. Quando os sicários de Tomás de Torquemada viram-se livres para investigar a vida alheia, a sanha persecutória conseguiu flagelar trinta mil vítimas por ano no reino da Espanha.

A “Comissão da Verdade” de que trata o Decreto de 13 de janeiro de 2010, certamente, será composta dos mesmos fanáticos que, no passado recente, adotaram o terrorismo, o seqüestro de inocentes e o assalto a bancos, como meio de combate ao regime, para alcançar o poder.

Infensa à isenção necessária ao trato de assunto tão sensível, será uma fonte de desarmonia a revolver e ativar a cinza das paixões que a lei da anistia sepultou.

Portanto, essa excêntrica comissão, incapaz por origem de encontrar a verdade, será, no máximo, uma “Comissão da Calúnia”.

General do Exército Maynard Marques de Santa Rosa"
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